segunda-feira, 7 de novembro de 2011

A pança e o tanque de gasolina


Vivemos, você sabe, uma crise mundial de energia. Se o fim do petróleo parece ter sido adiado em alguns anos pelas novas descobertas, inclusive no pré-sal brasileiro, continua evidente que não vai dar mais para queimar tanto óleo. E a queima de óleo é o que move a maior parte dos sistemas elétricos e dos veículos motorizados do planeta. Com a constatação cada vez mais inegável de que as mudanças climáticas são assunto sério e muito provavelmente já estão interferindo violentamente nas nossas vidas, precisamos de outras soluções e, apesar dos avanços, nenhuma das alternativas – solar, eólica, atômica, hidrogênio – parece pronta para substituir o petróleo.
Quer dizer então que está faltando energia no mundo? Outro dia eu estava me perguntando isso enquanto via as pessoas passarem pela rua e notava o tamanho delas. Quanta gente imensa, meu deus… Há, efetivamente, uma epidemia mundial de obesidade. 1 bilhão de pessoas do planeta estão com sobrepeso, 300 milhões são obesas, números que vêm acompanhados do crescimento explosivo de doenças crônicas como câncer, doenças cardiovasculares, hipertensão, derrames e diabetes tipo 2. Obesidade suga de 2% a 7% dos gastos de saúde dos países desenvolvidos. Desde os anos 1980s, as taxas de obesidade mais do que triplicaram na América do Norte, Reino Unido, Europa Oriental, Oriente Médio, China, Austrália e ilhas do Pacífico.
Aí me ocorreu: a energia que está faltando para mover nossas máquinas e nossas economias parece estar se acumulando nas nossas cinturas.

Parece uma relação absurda, mas não é. A energia que move motores é da mesma natureza da que move nossos músculos e que, quando não utilizada (porque só andamos de carro), é armazenada na forma de gordura. Moléculas orgânicas (como as do petróleo ou as da comida) usam energia para manter seus átomos colados uns nos outros. Quando queimamos o petróleo ou quando as mitocôndrias das nossas células processam as gorduras e os carboidratos, essa energia é liberada para poder ser usada. Tanto é assim que o subproduto das células é o mesmo das chaminés e escapamentos: gás carbônico.
Outro dia topei na internet com esse divertido infográfico feito pela revista americana Good ( ampliar):
O info faz uma correlação entre a energia consumida por um humano médio e a consumida por um carro médio. As unidades são as americanas – 1 galão corresponde a 3,8 litros. Portanto, 1 litro de gasolina tem 8.200 calorias – o equivalente a 40 copões de Guinness, 25 filets, 20 big macs, 7 potes de sorvete ou quase 80 bananas.
Se levarmos em conta que, na média, um motorista consome algo como 5 litros de gasolina por dia, chegamos à conclusão de que um carro gasta mais de 40.000 calorias por dia. Um carro, na média, em São Paulo, carrega 1,5 pessoa. Ou seja: ao usarmos um carro, consumimos 27.000 calorias (40.000 dividido por 1,5) para transportar uma pessoa ao longo de um dia.
Ora, 27.000 calorias para mover um mísero ser humano me parece uma ineficiência capaz de fazer qualquer estatal parecer um case de sucesso de MBA. Afinal, se usarmos as pernas e os braços, o gasto energético médio de um humano é de 2.000 calorias por dia. Andar de carro torra energia – gastamos 13 vezes mais para transportar o mesmo corpo.
Ontem eu assisti a um desses comerciais absurdos de carro. Era a propaganda de um desses jipões gigantes (que, obviamente, se passava num campo aberto, e não no trânsito parado). Para mostrar que o carro tinha espaço de sobra, ele carregava um elefante na carroceria. O slogan era algo na linha “cabe tudo o que você quiser”. Bom, um jeito de entender esse comercial é o seguinte: você não precisa de um carro tão grande a não ser que tenha um circo ou um zoológico. Se o carro tem espaço para um elefante, logo ele provavelmente é grande demais para o seu carrinho de bebê. Em outras palavras: comprar um carro desses é desperdiçar energia. Mas é óbvio que não é assim que o comercial é visto por muita gente. O que ele diz é “nunca se sabe o que você vai precisar carregar. Melhor estar preparado para tudo, inclusive para um elefante.”
Realmente, num mundo tão orientado para o consumo quanto o nosso, não é impossível que as compras do shopping center de uma família tenham dimensões paquidérmicas. Mas, na média, no dia-a-dia, nossos carros gigantes carregam muito pouco. Gastamos tanta energia e ocupamos tanto espaço na rua apenas para dispormos de espaço de armazenamento para eventualidades. Quando o trânsito pára na hora do rush, o que se vê é uma longa fileira de caixas semi-vazias de metal, cada uma delas queimando mais energia que um lutador de sumô.
Fico pensando que a solução para o problema é termos veículos bem menores e mais leves, que não gastem muito mais energia do que uma pessoa e meia. E, quando precisássemos carregar um elefante, poderíamos alugar ou emprestar um compartimento maior. Esses compartimentos poderiam ser compartilhados – assim como as bicicletas em Paris (e no Rio de Janeiro).
Mas a fantasia que eu tive outro dia foi mais longe: instalar nas cidades usinas elétricas movidas a esteiras de caminhada. Seria um modo de resolver nossas duas crises energéticas ao mesmo tempo: transferindo diretamente a energia acumulada nas nossas panças para os nossos sistemas de eletricidade.
Por Denis Russo Burgierman

Fonte: Veja

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